
Para que tal Código fosse realmente efetivo, era necessário harmonizá-lo com as diversas leis já existentes na Igreja; isso, sobremodo, servia para as Concordatas que eram acordos que a Santa Sé fazia com os Estados que o requisitavam de modo a regular as relações Igreja-Estado[1]. Esse trabalho de harmonizar o Código com as leis eclesiásticas e as Concordatas será entregue a Pacelli, que se desincumbirá dele com perfeição durante seus trabalhos como diplomata do Vaticano, até sua eleição a Papa. Para tanto, foi lhe dado, em 20 de junho de 1912, o título de Monsenhor[2] e o cargo de Pró-Secretário da Congregação dos Assuntos Eclesiásticos Extraordinários. Ele será promovido a Secretário dois anos depois, a 1º de fevereiro de 1914.
Desde o ano anterior, Pacelli tinha sido designado pelo cardeal Merry del Val, Secretário de Estado, para dirigir as negociações de uma Concordata com a Sérvia. O documento foi assinado em 24 de junho de 1914, cinco dias antes do assassinato, em Sarajevo, do arquiduque austríaco Francisco Ferdinando, fato que foi considerado o estopim para a Primeira Guerra Mundial. Autores como Cornwell (2000, p. 64) querem fazer crer que a Concordata Sérvia teria ajudado a exaltar os ânimos das partes em tensão, sobretudo a Áustria, que teria sido prejudicada em seus direitos de protetorado sobre a Sérvia. Segundo ele, a Concordata “sem a menor sombra de dúvida, contribuiu para as reparações duras que o Império Austro-Húngaro exigiu da Sérvia, tornando a guerra inevitável”. A consequência inevitável de tal asserção é que teria sido Pacelli, como principal negociador da Concordata como representante do Vaticano, um dos principais responsáveis pela deflagração da Primeira Grande Guerra, o que Cornwell insinua claramente.
Uma vez estourada a Guerra, o Papa Bento XV assume uma posição de imparcialidade perante as coalizões beligerantes, uma vez que há católicos em ambos os lados do front e recusa-se veementemente a tomar parte no conflito, de forma análoga ao que fará

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[1] Existiam três tipos de acordos que a Santa Sé assinava com os Estados nacionais: o Modus Vivendi, a Convenção e a Concordata. Os dois primeiros eram acordos simples que regulavam algumas questões particulares, que variavam de nação para nação, como por exemplo, a nomeação dos bispos, os limites das circunscrições eclesiásticas, a salvaguarda de associações católicas. Acordos como estes foram assinados com a França (em 1926), com Portugal (1928 e 1929), com a Tchecoslováquia (um Modus Vivendi, em 1927). Já as Concordatas eram acordos mais amplos e que envolviam vários aspectos que regulavam a convivência entre a Igreja e o Estado. Os acordos dividiam-se em três grupos, cada qual com suas peculiaridades: os assinados com Estados predominantemente católicos (Baviera, 1924; Polônia, 1925; Lituânia, 1927; Itália, 1929; Áustria, 1933), onde se buscava, em síntese, conseguir para o catolicismo o status de religião oficial; os firmados com Estados com forte e significativa presença católica (Tchecoslováquia, 1927; Baden, 1932; Prússia, 1929; Alemanha, 1933), tinham por objetivo adquirir certas facilidades mais ou menos importantes quanto às questões de educação católica e subvenção econômica; finalmente, os assinados com países com minorias católicas (Letônia, 1922; Romênia, 1927 e 1932), reivindicavam o princípio da liberdade religiosa e reconhecimento do catolicismo em par de igualdade com as outras religiões. O que havia de comum a todos esses acordos era a faculdade de livre escolha dos bispos pela Santa Sé, podendo o Estado objetar o escolhido por motivos políticos; o clero e os responsáveis pelas ordens e congregações religiosas deveriam ser cidadãos do país e deveriam estar afastados da militância política (VERUSO, 1996, p. 56-58).
[2] “O título de monsenhor é conferido pelo Papa a um clérigo, por mérito ou antiguidade de serviço, ou como categoria correspondente às tarefas confiadas aos seus cuidados” (LEEN, 195-, p. 40), este último sendo o caso de Pacelli. Ele também seria nomeado Cônego da Basílica de São Pedro, cujo cabido era responsável pelo canto solene do Ofício Divino, a oração oficial da Igreja (LEEN, 195-, p. 40).
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