segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Pio XII e a Segunda Guerra Mundial na Europa - Introdução

Caro Leitor,
como já adiantei na Apresentação deste blog, o que mais me motivou a criá-lo foi a vontade de disponibilizar para quem quizesse se aprofundar um pouco neste assunto tão interessante e polêmico, um estudo que fiz e que tomou a forma de um TCC que apresentei no Curso de Licenciatura em História na Universidade Federal de Alagoas. Naturalmente que o que uma universidade pode oferecer a um estudante de História no Brasil de hoje está muito aquém do necessário para se formar um historiador decente; e tenho a consciência clara de que esta formação acadêmica foi só um ponta pé inicial em meus estudos históricos. No entano, desejo compartilhar com você o que escrevi a respeito deste Pontífice tão polêmico e, como vocês poderão ver, tão grande quanto foi o Papa Eugenio Pacelli. Desde já perdoem quaisquer erros historiográficos, parcialidades, erros de análise, de gramática, de estilo... todas as correções serão bem-vindas. Espero, é claro, corrigi-lo e ampliá-lo com outros estudos, na medida do possível.
Disponibilizarei aos poucos o trabalho inteiro. Fiquem agora com a introdução:
.
INTRODUÇÃO
.
A história, longe de elucidar os papéis que couberam aos homens notáveis nos acontecimentos passados, frequentemente torna as figuras dessas personagens mais enigmáticas e difíceis de compreender. Parece que a única coisa possível é o partidarismo: toma-se parte contra ou a favor de determinados personagens históricos. A causa primeira disso parece ser a tendência humana para classificar ou rotular as pessoas a partir de um ponto de vista dualista, bom ou mal.
Uma das classes de pessoas que mais sofreu esse tipo de bipolaridade historiográfica (e, quase sempre com juízo de valor negativo), foram os Papas. A principal causa disso está, provavelmente, no fenômeno da secularização, observado a partir da Idade Moderna e que parece hoje onipresente, sobretudo nos meios intelectuais. Um dos primeiros passos desse processo foi o questionamento da autoridade papal na medida em que, no fim da Idade Média, a escolástica entrava em declínio e novas formas de pensamento iam pouco a pouco penetrando a filosofia e a teologia. Seu estopim aconteceu, sem dúvida, naquele conturbado século XVI, onde se viveu o calor da Reforma Protestante, a renovação da Renascença e o ardor suscitado pelas primeiras descobertas da ciência moderna. Desde então, a autoridade e a idoneidade da Igreja Católica diante da sociedade vem declinando, século após século, até se tornar, nos dias de hoje, irrelevante em diversos lugares. A secularização é acompanhada, não necessariamente, mas quase sempre, por perseguições veladas ou declaradas, mesmo nos países que têm uma tradição cultural cristã mais ou menos solidificada. Basta pensar no Ocidente como um todo no que se refere à perseguição velada e aos países de maioria islâmica ou comunistas que perseguem, ainda hoje, os cristãos abertamente. Na Coréia do Norte, por exemplo, o governo comunista promove perseguições aos cristãos a ponto de prender muitos em campos de concentração que não devem nada aos campos nazistas ou aos gulags russos. Diante do recrudescimento da violência física e moral de que são vítimas numerosos cristãos no mundo inteiro, cumpre com urgência ajudar as pessoas a ter uma visão mais correta e menos preconceituosa do papel da Igreja e do Cristianismo na história e nos tempos hodiernos. Hoje se fala muito em respeito às minorias e às culturas. Os cristãos são minoria em muitos países do mundo e, nessa condição, vítimas do preconceito e da perseguição, sobretudo em países islâmicos ou comunistas; mas, mesmo nos países em que são maioria, frequentemente são desrespeitados, ridicularizados e preteridos pelo simples fato de serem cristãos. Os exemplos são abundantes. Nos países que mais prezam e pregam a democracia e a liberdade, os fatos mostram que os que dizem defender tais valores e combater o preconceito, muitas vezes são os primeiros a serem preconceituosos com os cristãos. Este quadro todo é preocupante. A história nos mostra que uma contínua aversão intelectual e prática a classes, raças ou religiões permite, cedo ou tarde, que disso se aproveite ideologias revolucionárias destrutivas e genocidas que sempre vem à tona com diferentes roupagens nas diferentes épocas e lugares. A humanidade parece não aprender com os próprios erros.
Nesse grave problema, o historiador é também chamado a dar a sua contribuição. Esta consiste em apresentar sempre de maneira renovada e o mais rigorosamente possível os fatos depreendidos dos documentos e dos testemunhos fidedignos. A construção, ou melhor, a reconstrução dos fatos históricos tal como ocorreram deve ser sempre o objetivo último do pesquisador da História. Abdicar disso para, ao invés, assumir partidarismos e representar ideologias que fixam a priori os papéis dos vultos históricos sem respeitar a factualidade histórica, é trair o ofício de historiador. Desejamos fugir de tal comportamento.
Uma das figuras mais controversas do século XX é a de Eugênio Pacelli, o Papa Pio XII, Pontífice durante duas décadas, influente dentro e fora da Igreja, responsável pela liderança espiritual de quase meio bilhão de pessoas em todo o mundo na hora mais trágica e negra da história humana: a Segunda Guerra Mundial.
A figura de Pio XII é extremamente rica de temas e nuances que merecem ser estudados com profundidade. De fato, a cinquenta anos de sua morte, muitos estudos lhe foram dedicados, mas os diversos aspectos que envolvem sua pessoa estão longe de ser esgotados e têm de ser aprofundados. Este trabalho constitui uma tentativa de apresentar de forma sucinta o Pontificado de Pio XII no que concerne à Segunda Grande Guerra, a partir da bibliografia disponível em língua portuguesa. É de se lamentar a pobreza da historiografia em nossa língua num tema tão importante e polêmico quanto esse. Entretanto, para este trabalho, a compreensão do papel de Pio XII durante a Guerra não deve ser prejudicada, já que a bibliografia tomada, de diferentes orientações ideológicas, oferece um quadro rico de documentos e dados que permitem apresentar com fidelidade, em linhas gerais, sem descer a detalhes secundários, o pontificado de Pio XII durante o pior conflito da história da humanidade.
Este trabalho se divide em cinco partes. A primeira constitui uma breve nota biográfica que mostra a infância, a juventude e os primeiros anos da vida adulta de Eugenio Pacelli, desde sua ordenação sacerdotal, passando pelo seu trabalho na Cúria romana como especialista em Direito Canônico e as primeiras lições de sua carreira diplomática, até sua nomeação para Núncio Apostólico na Alemanha e seu trabalho, por treze anos, como representante papal em Munique e em Berlim.
A segunda parte, partindo para uma visão mais ampla da história europeia, mostra o trabalho de Pacelli, criado Cardeal no fim de 1929, como Secretário de Estado do Vaticano, o cargo mais importante da burocracia eclesiástica depois do Papa. Veremos como Pacelli lidou com problemas graves como as relações da Igreja com a Itália fascista, com a Alemanha Nazista nascente e com o perigo cada vez maior do Comunismo na Rússia, na Espanha e no México. A relação da Igreja com Hitler, até atingir o cume das tensões com a publicação da encíclica de Pio XI – redigida em grande parte por Pacelli – Mit brenneder Sorge, é analisada com detalhes, dando-se destaque, também, às primeiras perseguições nazistas aos judeus. A segunda parte abrange toda a década de 1930, até o momento da morte de Pio XI, em fevereiro de 1939, quando as sombras de uma nova Guerra Mundial ameaçavam pairar sobre a Europa.
A terceira parte mostra a eleição de Pacelli para o Papado, seus hercúleos esforços diplomáticos para evitar a Guerra e os primeiros anos do conflito. Da invasão da Polônia ao seu martírio nas mãos de nazistas e comunistas, passando pelo complô anti-Hitler no qual o Papa Pacelli se envolveu ativamente; pelos esforços para evitar a extensão do conflito; pela abertura da frente Ocidental com a conquista de França, Holanda, Bélgica e Luxemburgo; pela batalha da Grã Bretanha e até a entrada dos Estados Unidos, da Rússia e do Japão na Guerra, esta parte mostra toda a ação da Pio XII para limitar o conflito e diminuir-lhe a duração.
Na quarta parte veremos o desenvolvimento da Guerra agora Mundial com as ofensivas japonesa no Pacífico e alemã na Rússia, e a situação nos países europeus envolvidos no Conflito: Alemanha, Polônia, Países Bálticos, Eslováquia, Croácia, Romênia, Hungria e, finalmente, a Itália, onde a salvaguarda de Roma dos bombardeios Aliados contra alvos italianos e, posteriormente, alemães na cidade, foi alvo dos mais ingentes esforços do Papa para que se evitasse a destruição da cidade que abrigava o maior patrimônio artístico e cultural do mundo e que era a capital espiritual de centenas de milhões de pessoas.
A quinta e última parte mostra o fim da Guerra, detendo-se sobre o plano de sequestro do Papa intentado pelos nazistas quando Roma estava ocupada no fim de 1944, para em seguida mostrar a saída das tropas alemãs, que deixaram a cidade intacta, e a chegada das tropas Aliadas. Em seguida, há uma análise do problema do Holocausto e do suposto silêncio do Papa sobre o assunto. Finalmente, veremos o fim da Guerra, desde a passagem da Alemanha para uma posição defensiva após a derrota em Stalingrado e a consequente ofensiva dos russos no front Oriental e dos Aliados no Sul, em 1943 e no Leste em 1944, até a derrota da Alemanha, depois do suicídio de Hitler, em 30 de abril de 1945, com assinatura da rendição incondicional uma semana depois.
Ao abordar sobretudo a ação de Pio XII na Guerra, este trabalho concentra-se quase que exclusivamente na Guerra na Europa, o principal teatro dos conflitos e onde o Pontífice esteve diretamente envolvido. Dessa forma, a Guerra no Pacífico e no Extremo Oriente não é tratada aqui, a não ser em breves acenos, uma vez que a intervenção direta do Papa era muito limitada pelas condições geográficas e pelo turbilhão próprio em que ele estava envolvido.
.
.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Deixe seu comentário